Sesimbra distingue Luiz Saldanha, Miguel Telles e Galopim de Carvalho
A Câmara Municipal de Sesimbra distinguiu, com o Medalhão da Vila de Sesimbra, os investigadores Luiz Saldanha, a título póstumo, Miguel Telles e António Galopim de Carvalho, em reconhecimento pelo contributo destes três investigadores para a classificação, como monumento natural, das jazidas com vestígios de pegadas de dinossauros da Pedra da Mua e Lagosteiros, no Cabo Espichel, e da Pedreira do Avelino, no Zambujal.
A homenagem teve lugar no dia 7 de maio, na Igreja de Nossa Senhora do Cabo Espichel, no âmbito da cerimónia evocativa dos 25 anos da classificação destes monumentos naturais, datados entre o Jurássico superior e o Cretácico inferior, e que integram a lista dos sete monumentos naturais do país.
«É um prazer termos hoje aqui a comunidade científica neste dia, que também é de homenagem a três investigadores, a quem agradecemos profundamente pelos contributos fundamentais para a classificação das jazidas de dinossauros do Cabo Espichel e do Zambujal. Eles foram os elos de uma corrente que tornou possível esta classificação, e que nos permitiu estarmos hoje a assinalar esta data», referiu o presidente da Câmara Municipal de Sesimbra, Francisco Jesus, que entregou o Medalhão da Vila de Sesimbra a Galopim de Carvalho.
«É com muita satiafação que estou hoje aqui. Agradeço à Câmara de Sesimbra por esta homenagem e pelo que tem feito pela preservação e divulgação do património natural», afirmou Galopim de Carvalho.
Miguel Telles Antunes, outro dos homenageados, agradeceu a homenagem e lembrou a sua relação com Luiz Saldanha. «Quero agradecer a Câmara Municipal esta honra que nos deram e quero aqui também realçar a memória de Luiz Saldanha, meu colega e amigo, que me convidou a participar nesta descoberta».
Em representação de Luiz Saldanha, o seu filho, Miguel Saldanha, mostrou-se sensibilizado com a distinção, em nome da família. «Agradecemos com toda a alegria este momento, e felicitamos a autarquia por evocar os 25 anos da classificação destas jazidas».
O acontecimento contou com a presenca de vereadores, presidentes da Assembleia Municipal e Junta de freguesia do Castelo, João Narciso e Maria Gomes, respetivamente, representantes de várias entidades e muitos convidados, que tiveram oportunidade de assistir a uma apresentação, por parte de Paulo Sá Caetano, da Faculdade de Ciências e Tecnologia, da Universidade Nova de Lisboa, e Ana Azerêdo, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), alusiva ao conhecimento geológico de Sesimbra - evocação de Miguel Ramalho e Jacques Rey, onde foi dado a conhecer o contributo dos dois investigadores para um melhor conhecimento do território de Sesimbra.
A iniciativa terminou com um apontamento musical por Luís Taklin.
A descoberta das jazidas
Em agosto de 1971, quando Luiz Saldanha desenvolvia o seu doutoramento sobre a fauna da costa da Arrábida, os pescadores e apanhadores de algas da praia dos Lagosteiros levaram o investigador a conhecer a Pedra da Mua e as evidências do milagre da Senhora do Cabo, que hoje conhecemos como a jazida de pegadas de dinossauros. Fascinado com a valor do conjunto de pegadas, pediu a colaboração de Miguel Telles Antunes, professor de ciências geológicas na Universidade de Lisboa, e, durante anos, acompanhados pelas suas famílias, por aqui se mantiveram a estudar este importante achado.
Foi quando procuravam o melhor ângulo para fotografar a Pedra da Mua, que descobriram, por acaso, as pegadas dos Lagosteiros. Em relação à jazida da Pedreira do Avelino, foram os próprios funcionários da pedreira, sabendo da investigação que os dois professores estavam a desenvolver no concelho, que os chamaram ao local e lhes mostraram a laje descoberta durante os trabalhos da empresa.
Mais tarde, durante os anos 90, António Galopim de Carvalho, então diretor do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, soube sensibilizar o poder político, desde as autarquias ao Presidente da República, até conseguir os processos de classificação que protegem atualmente os registos de icnofósseis de Sesimbra.
Os investigadores
Luiz Saldanha
Foi em agosto de 1971, quando o professor Luiz Saldanha desenvolvia os trabalhos de investigação para o doutoramento sobre a fauna da costa da Arrábida, que os pescadores e apanhadores de algas da praia dos Lagosteiros o levaram, juntamente com o seu tio Eduardo da Cunha Serrão, a conhecer a Pedra da Mua e as suas evidências do milagre da Senhora do Cabo. Luiz Saldanha percebeu que as pegadas de mula tinham afinal sido deixadas por dinossauros, que por ali tinham passado muitos milhões de anos antes. Enquanto biólogo, sabia que o estudo dos trilhos seria limitado, pelo que rapidamente entrou em contacto com o seu colega de Faculdade dedicado à Geologia, Miguel Telles Antunes, e o trouxe para o Cabo. Juntos por cá ficaram a estudar: o professor Telles Antunes as pegadas e o professor Luiz Saldanha a especificidade do mar da Arrábida e as suas inúmeras espécies.
Desde 1965, que o professor Luiz Saldanha defendia a criação de uma reserva marinha na costa da Arrábida. Foi pioneiro no domínio da biologia marinha em Portugal, começou o ensino universitário das disciplinas de biologia marinha e participou em projetos científicos e expedições oceanográficas por todo o mundo, que ilustrava com desenhos a lápis e aguarela.
Em 1998, um ano depois da sua morte, o seu nome é atribuído à primeira reserva marinha em Portugal, na costa da Arrábida: o Parque Marinho Professor Luiz Saldanha.
Miguel Telles Antunes
Miguel Telles Antunes foi o primeiro paleontólogo a deslocar-se a Sesimbra para estudar as pegadas de dinossauros. Começou por identificar e classificar os trilhos da Pedra da Mua, mais tarde descobriu os trilhos dos Lagosteiros e foi a quem chamaram para mostrar a Laje da Pedreira do Avelino. São suas as primeiras publicações sobre dinossauros em Sesimbra.
Vários outros investigadores de todo o mundo o antecederam no estudo geológico do território, mas muitos o seguiram no conhecimento das pegadas. Sabe-se que os trilhos da Pedra da Mua deram início a uma revolução científica na compreensão daqueles misteriosos animais. Pela primeira vez, na Pedra da Mua encontraram-se evidências do seu comportamento gregário (em grupo). Este facto, retira os dinossauros de uma vez por todas da estrita esfera dos répteis e o eco desta descoberta reflete-se no filme Parque Jurássico, de Steven Spielberg, de 1993, que reproduz o comportamento dos animais conforme as pegadas deixadas na Pedra da Mua.
António Galopim de Carvalho
O professor António Galopim de Carvalho envolveu a comunicação social e o poder político na divulgação dos dinossauros em Portugal. Nomeado diretor do Museu Nacional de História Natural da Universidade de Lisboa, em 1993, aproveitou a visibilidade do cargo para, como ninguém antes, apaixonar os portugueses pelos dinossauros. Entre exposições, divulgação nos media e contactos que foi construindo com o poder político, comunicou de uma forma sábia os dinossauros. Mostrou ao país que possui uma riqueza patrimonial como poucos. Das suas gravatas com dinossauros até à formulação do conceito de Geomonumento, investiu grande parte do seu tempo, até aos dias de hoje, na valorização e salvaguarda do património geológico e paleontológico nacional.
Através do professor Galopim todos os portugueses ficaram a saber que, há muitos milhões de anos, por aqui passaram dinossauros e começaram a ter orgulho no seu património geológico, que as rochas podem ser monumentos. Pode ter sido um caminho duro, mas esta campanha de divulgação nacional foi fundamental para sensibilizar o poder político, das autarquias ao Presidente da República, para a valorização, conservação e classificação as pegadas de dinossauros. Podia parecer uma quimera no início, mas hoje Portugal tem sete Monumentos Naturais, seis dos quais incluem pegadas, e cujos processos de classificação contaram com a sua colaboração científica. Três desses monumentos encontram-se em Sesimbra e estão conservados, musealizados ou em processo de musealização e são visitáveis de modo autónomo ou em visita acompanhada.