Uma pintura «única e magnífica»
Nossa Senhora da Misericórdia, quadro cedido pela Santa Casa da Misericórdia, é uma das obras mais importantes do valioso espólio de arte sacra do Núcleo Museológico da Capela do Espírito Santo dos Mareantes. A sua conservação, restauro e estudo científico, que se iniciaram em 2014, serviram de mote a uma conferência que juntou especialistas de várias áreas e permitiu enriquecer o conhecimento sobre a obra, da autoria do pintor régio Gregório Lopes.
«Desejo que esta conferência sirva para sairmos todos daqui mais orgulhosos pela obra que em conjunto fomos "construindo"», expressou Felícia Costa, vereadora do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal, na abertura da conferência dedicada ao processo de conservação, restauro e estudo científico do painel Nossa Senhora da Misericórdia, da autoria do pintor régio Gregório Lopes, que se realizou em janeiro na Capela do Espírito Santo. «Também espero que sirva para ficarmos mais alerta e mais despertos para a preservação do património e da memória coletiva», frisou.
Felícia Costa aproveitou a ocasião para agradecer ao provedor da Santa Casa da Misericórdia de Sesimbra, Manuel Adelino, também presente, a cedência do quadro de Gregório Lopes, assim como de várias outras obras que fazem parte da exposição de arte sacra do núcleo museológico da Capela. Para o representante da Santa Casa, «foi uma parceria muito feliz que permitiu não só recuperar as obras que tinha, mas essencialmente divulgá-las e disponibilizá-las a toda a comunidade».
A palestra prosseguiu com a intervenção de Vanessa Antunes, do Instituto História da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, que apresentou de forma detalhada os resultados do estudo da caraterização técnica e material da pintura. O estudo desta obra foi um privilégio, por se tratar de uma pintura «única e magnífica», salientou.
Alexandra Lauw, do Centro de Estudos Florestais do Instituto Superior de Agronomia Universidade de Lisboa, deu continuidade ao encontro abordando os estudos sobre a sua base, a madeira. «Estudámos a madeira, vimos de onde veio, como cresceu e demos-lhe uma data». O resultado revelou que a madeira utilizada é de carvalho, e que a data a partir da qual o pintor realizou a obra foi 1532. «No conjunto das tábuas a data mais recente que estatisticamente me deram foi 1521, ou seja, nesta data a árvore ainda existia. Depois acrescentámos mais nove anos, que correspondem à casca e ao borde, e o tempo de secagem da madeira, que normalmente são dois anos», explicou.
Maria José Francisco, do Museu de Setúbal, responsável pela conservação e restauro da obra, garantiu ter encontrado a pintura em bom estado de conservação com exceção das zonas de união de suporte. «O principal critério da intervenção foi devolver à obra as suas caraterísticas originais intervindo o mínimo possível», explicou. Para a conservadora, uma das fases mais sensíveis foi a limpeza química dos vernizes oxidados, pois foi preciso fazer vários testes e ensaiar os solventes.
O painel de oradores terminou com a apresentação de António Baptista Pereira, da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, intitulada O Painel Nossa Senhora da Misericórdia de Gregório Lopes: Questões de História, Iconografia e Estilo. «Este quadro tem um valor imenso por ser uma das mais antigas representações em Portugal sobre a Nossa Senhora da Misericórdia e por ser a mais notável, tanto pela realização pictórica como pela escala, porque as outras que conhecemos são francamente mais pequenas», declarou o professor.